Diante do novo paradigma tecnológico colocado em curso pela digitalização, diversos campos teóricos têm empreendido investigações sobre os processos de produção de sentido no âmbito dos dispositivos interativos. Com foco na usabilidade destes artefatos, diferentes modelos teóricos têm sido empregados para o equacionamento de questões ligadas às condições de usabilidade. De forma correlata, o presente artigo se insere nesta perspectiva de investigação, refletindo sobre a articulação dos conteúdos narrativos de um videoclipe musical com as possibilidades dos recursos interativos instaurados pelos meios digitais. Com tal intuito, propõe uma abordagem da produção do sentido na relação com artefatos digitais, tomando como objeto de análise o videoclipe interativo 360° Saturnz Barz, da banda Gorillaz. Disponibilizado em diferentes plataformas em 2017, o audiovisual em questão utilizou-se de uma estrutura narrativa inovadora ao permitir a interferência do público no encadeamento dos cortes de câmera e na dinâmica da montagem. Nestas condições, observa-se a instauração de um regime de produção de sentido ligado às competências cognitivas do próprio destinatário, convertido em uma espécie de usuário e co-autor no ato mesmo da interação. Desta feita, o artigo em questão problematiza a geração do sentido em processos de natureza interativa, buscando compreender a dinâmica de apreensão dos efeitos de sentido resultante da incorporação de recursos de imersão e controle em um audiovisual. Nestes termos, o presente estudo propõe uma aproximação com o domínio do design de interação, o que permite ultrapassar a noção narrativa de uma textualidade encerrada em si mesmo e restaurar o papel central do usuário como interactante dotado de competências cognitivas e estésicas. Metodologicamente, o estudo busca sua base teórica nos desenvolvimentos recentes da corrente semiótica francesa, que tem se ocupado de diferentes manifestações que se enquadram na categoria das práticas interacionais. Para tal fim e de acordo com este plano de ação, a análise lança mão das categorias semióticas do percurso gerativo de sentido apresentadas por Greimas e Courtés (2008) e Fiorin (2012), além de empregar os desenvolvimentos em torno da chamada semiótica plástica apresentados por Teixeira (2016) e Pietroforte (2015;2016) e o modelo semiótico-interacional de Landowski (2014). Com o foco nas possibilidades de efeitos de sentido que emergem durante o processo das interações, ou seja, em ato, o estudo discute a problemática geral das dinâmicas de emergência do sentido nos dispositivos digitais, descrevendo o papel narrativo dos recursos interativos empregados. O exame das homologações entre os planos do texto e as ações limitadas do usuário reforçam o sentido surreal da letra da canção, cujo foco recai sobre uma experiência de vertigem e delírio. Aludindo a uma grande variedade de outras obras da própria banda, o clipe estabelece articulações intertextuais variadas, construindo um simulacro de interlocutor - interactante - investido de competências intelectuais e sensibilizado pelo caráter adesivo da narrativa.